Autor

Jorge Faustino

Data: 19/09/2017

Os “porque é que não?” do VAR

Torna-se quase inevitável abordar, semanalmente, a temática do videoárbitro. Primeiro, porque em todas as jornadas temos situações que suscitam dúvidas e discussão sobre se o VAR deveria ter tido ou não intervenção em determinado lance. Segundo, porque apesar da informação que vem sendo disponibilizada pelo International Board, pela Federação Portuguesa de Futebol e também, reconheça-se, pelos meios de comunicação social em Portugal, há ainda muitas dúvidas sobre os detalhes da implementação e concretização do projecto videoárbitro.

Sou regularmente abordado com questões sobre o processo de “decisão” do VAR. A maior parte vezes com casos específicos que vão acontecendo nos jogos da nossa Liga. A análise destes “casos” particulares permite ir ajudando a perceber o âmbito de intervenção do VAR mas não esclarecem os porquês de algumas regras e limitações do mesmo.

Outro tipo de questões que me colocam, também frequentemente, são as relacionadas coma ausência de algumas possibilidade, processos e/ou decisões que ficaram excluídos do já famoso Protocolo do VAR. São três destes “porquês” que abaixo procuro responder com base na informação disponibilizada pelo International Board (IFAB) e inscrita no próprio protocolo.

Por que razão não foi implementada a possibilidade dos treinadores ou outros elementos ligados às equipas pedirem a revisão de um lance?

Considerando que o sistema VAR serve para erros claros e óbvios, o IFAB considerou que é altamente improvável que um treinador veja um erro óbvio que não tenha sido detetado pelo VAR. Daí, considerar-se que, em princípio, não há necessidade de um treinador pedir uma revisão.

Para além do argumento anterior, na fase de construção do protocolo em que treinadores e jogadores foram ouvidos, estes consideraram que as revisões por parte dos treinadores eram indesejáveis já que seriam provavelmente, em muitas situações, usadas por razões técnicas, muitas vezes antidesportivas.

Se um cartão vermelho direto é uma situação que pode alterar o jogo, e por isso merece ser revista, porque razão um segundo cartão amarelo não pode ser revisto?

Os adeptos do futebol têm dificuldade em perceber porque é que duas situações que resultam na expulsão de um jogador (vermelho directo e segundo cartão amarelo com respectivo vermelho) são vistas de forma diferente pelo projecto VAR.

O IFAB entende que se um segundo cartão amarelo fosse revisto, era de elementar justiça que também o primeiro cartão merecesse a mesma atenção. Tal exigiria que todos incidentes de cartão amarelo teriam de ser revistos, inclusive quando um árbitro, possivelmente por erro, não exibisse um cartão – tal resultaria em demasiadas interrupções do jogo (por exemplo o Rio Ave – Porto desta jornada teve oito cartões amarelos, um vermelho por acumulação e várias outras possíveis situações de cartão amarelo).

Por que razão não são revistas as decisões de recomeço, por exemplo um pontapé de canto ou lançamento lateral erradamente assinalado e a partir do qual um golo é marcado?

Também neste caso são dois os argumentos que explicam esta impossibilidade. Primeiro, as Leis do Jogo não permitem que um árbitro altere uma decisão depois do jogo ter recomeçado. Ora, quando um pontapé de canto, lançamento de linha lateral ou pontapé-livre é assinalado a decisão acontece no momento em que o árbitro indica a quem pertence a bola ou quem cometeu uma infracção. A partir do momento em que se executa esse canto, lançamento ou livre, a bola entra em jogo ficando o árbitro impossibilitado, por lei, de alterar a sua decisão.

O outro argumento está relacionado com a preocupação fundamental do IFAB de que o processo VAR tenha a mínima interferência no decorrer do jogo. Se o VAR tivesse intervenção nas situações acima, exigiria que cada decisão de recomeço fosse revista para o caso de um golo vir a acontecer na fase seguinte do jogo. Tal resultaria em demasiadas interrupções do jogo.

Fonte: Público