Hoje em dia, o início do jogo não é o momento em que tudo começa: é o culminar de um “trabalho de casa” feito, com muita entrega e intensidade, nas semanas anteriores.
Como sabem, a época regular termina (habitualmente) em meados/fins de Maio. Logo no início de Junho, os árbitros “profissionais” retomam a sua preparação. Como veem, o tempo de paragem é curto, porventura até inferior àquele que dispõem a maioria dos plantéis.
Essa fase, a de pré-época, é duríssima.
O plano de treinos é exigente, quase personalizado e obriga a um compromisso tremendo da parte de todos.
As rondas iniciais dos jogos europeus e as várias partidas de preparação obrigam a que cada um deles esteja física e mentalmente apto para entrar em ação bem cedo.
“A FASE DE PERDA”
A validação dessa aptidão é efetuada através de uma bateria de testes médicos e físicos, que só ultrapassa quem realmente se entrega ao trabalho com empenho e seriedade.
Entramos aí naquela a que chamamos a “Fase de Perda”: perda de peso, perda de perímetro abdominal/volume – a medição de pregas é uma constante e falhar aí pode ser sinónimo de atrasar o regresso ao ativo -, perda de maus hábitos, perda de gula, perda de noites mal dormidas.
É tempo de queimar excessos, de descansar, comer bem e de entregar o corpo e a mente ao que mais importa.
O resultado exterior está à vista: os árbitros de hoje são visivelmente magros, correm mais e aparentam estar sempre em forma. São verdadeiros atletas com estampa de atletas verdadeiros.
Isso é fundamental por duas razões: porque, estando perto da jogada e sem fadiga acumulada, decidem quase sempre melhor; e porque, para o exterior, essa imagem “vende” credibilidade: toda a gente acredita mais num árbitro com presença do que noutro com aspeto físico mais debilitado.
Na arbitragem, não basta ser. Nunca basta ser.
OS ÁRBITROS CORREM UMA MÉDIA DE 10/12 KMS POR JOGO
Para que tenham noção, em alta competição, os árbitros correm uma média de 10/12 Kms por jogo (às vezes mais) em ritmos alternados, com mudanças de velocidade/direção e com a obrigação adicional de manterem a lucidez para as decisões cruciais. Decisões que podem surgir no último segundo de um jogo bem exigente.
Isso dá muito trabalho, sobretudo se tivermos em conta que a sua média de idades é bem superior à dos atletas que tentam acompanhar em campo.
Mas essa vertente, a do treino físico, é apenas uma das áreas em que trabalham.
Antes e durante cada época, os árbitros sujeitam-se também a vários testes escritos, psicotécnicos e de inglês. Frequentam várias ações de formação, cursos de reciclagem e estágios.
Efetuam ainda os chamados treinos “técnico-táticos”, ou seja, simulam em campo e em sala vários lances, movimentações e tomadas de decisão.
Isso aplica-se quer a quem arbitra no centro do terreno, quer à restante equipa (árbitros assistentes, VAR e AVAR).
O trabalho que hoje é feito é melhor, bem melhor do que aquele que se fazia há uns tempos.
Hoje há meios e recursos para fazer mais e melhor, mas o futebol não para de evoluir e a exigência não pára de aumentar. O escrutínio de cada decisão nunca foi tão grande como é atualmente.
Esse fardo adicional obriga a uma vigilância atenta. Há sempre margem para crescer, em qualidade. Há sempre novos métodos para introduzir, novas condições para dar e mais qualidade para extrair.
A classe deve continuar a seguir esse caminho, o da evolução permanente.
Tem que profissionalizar-se em definitivo e tem que acompanhar, bem de perto, o trabalho de base que é feito a nível local, em cada associação regional. As meninas/os que hoje começam a arbitrar têm que ser os nossos “Collinas” de amanhã. Só serão se não se sentirem sozinhos.