A Liga Portugal anunciou que vai organizar, em breve, um encontro com todos os treinadores das suas competições profissionais. A agenda não estará fechada, mas na qualidade de ex-árbitro e atual comentador desportivo, gostava de deixar aqui uma sugestão: que se reservasse algum tempo para abordar a relação que técnicos e demais agentes desportivos devem manter entre si.
Todos sabemos que há excessos que são visivelmente inaceitáveis. E são inaceitáveis porque constituem um mau exemplo de liderança, uma perigosa referência para os mais novos e um tiro fatal na imagem da competição e do seu organizador.
É “lose, lose”.
Esta constatação, que me parece clara, não implica que se adotem comportamentos angelicais nem posturas passivas. O futebol não é uma missa e nenhum dos seus protagonistas é santo.
Quem esteve lá dentro, a sentir e viver intensamente o que acontece, sabe que é muito difícil manter a lucidez a toda a hora. Há variáveis que testam a paciência e toldam o discernimento do melhor dos humanos. Certo.
Mas há reações e reações e há umas que não podem ultrapassar uma fronteira: a que separa o aceitável do inadmissível. Insultos reiterados, má-educação constante e deselegância a toda a hora não é apenas motivada por cabeça quente. É outra coisa qualquer.
Tenho a certeza que muitos dos nossos treinadores – bons chefes de família, excelentes profissionais e pessoas de bem – serão os primeiros a reconhecer que por vezes se excedem. Que nem sempre são a imagem de elegância e elevação que se exige a um líder.
Quem sabe se nessa conversa não se chegará a um compromisso de honra? A uma espécie de “pacto de não agressão” para o futuro? Também passa por eles o fim da toxicidade que insiste em poluir o ambiente que gira em torno do futebol. Eu acredito.
E os árbitros? E os dirigentes? E os comentadores?
Convém no entanto não esquecer, porque é da mais elementar justiça que assim seja, que toda a moeda tem dois lados. Por isso, seria igualmente importante que se efectuasse idêntica abordagem com os árbitros.
Mesmo sob forte pressão e escrutínio apertado, estão “obrigados” a dar a resposta certa a cada momento. E a resposta certa mais não é do que um misto de saber teórico com inteligência emocional: numas vezes a sanção disciplinar é a única resposta possível. Noutras basta um olhar, uma palavra, um sorriso (ou cara feia). Quando uma opção substitui a outra erradamente, saem decisões controversas, quase sempre assentes em critérios pouco uniformes. É também isso que abre a porta à crítica feroz e à conversa sobre competência e integridade. Escusadamente.
Ficam a faltar os outros. Dirigentes, jornalistas e comentadores.
Todos têm um papel ativo na formação de opinião e, em muitos casos (demasiados) cumprem mal o seu papel. Fazem-no estrategicamente, para afirmação pessoal ou simplesmente porque não sabem mais.
Também esses (onde me incluo) têm que conhecer a relevância que cada palavra, cada gesto ou tomada de posição tem junto dos adeptos, das massas, da perceção pública em geral.
De que vale haver entendimento em campo, se fora dele há uma visão parcial, distorcida e perversa do espectáculo ou dos seus atores?
No meio de tudo isto, o importante mesmo é que todos saibamos cumprir bem o nosso papel, sendo que “cumprir bem” não é acertar sempre ou ter razão a toda a hora: é ser ético, responder à sua consciência e saber discordar sem ofender nem insultar.
Tudo se resume a uma palavrinha simples: ética. Quem tem, tem. Quem não tem… percebe-se que não tem.
Nota final – Esta crónica podia ter sido diferente e falar sobre outro tema igualmente atual. Não o é porque há momentos em que o silêncio é mais impactante do que qualquer outra coisa que se diga ou escreva. Em frente.