Autor

Jorge Faustino

Data: 23/05/2019

Árbitro com coragem

Quando um jovem, rapaz ou rapariga, normalmente com idade entre os 16 e os 20 anos, decide tirar o curso de árbitro está a ser corajoso. Quando não abandona a arbitragem após os primeiros jogos, em que tem de tomar decisões que deixam os seus amigos, ou mesmo desconhecidos, chateados consigo, está a ser muito corajoso. É corajoso quando sai de casa, num chuvoso e frio sábado de manhã, para dirigir um jogo de crianças. Jogo onde vai ganhar 7 euros e onde, muito provavelmente, vai ser insultado por pais de colegas seus.

Quando esse jovem abdica de estar com os amigos e família porque tem de arbitrar quatro ou cinco jogos num fim de semana continua a dar provas da sua coragem. Mais à frente na sua carreira, quando passa a fazer parte dos 20% de árbitros que não abandonam a atividade nos primeiros dois anos de arbitragem, já não deveria precisar de provar a ninguém que é mesmo muito corajoso.

Depois, vai seguindo a sua vida e progressão na arbitragem. A grande maioria não atinge os quadros nacionais e mantém-se pelas competições distritais a construir e a exibir a sua coragem. Um grupo reduzido de corajosos tem a oportunidade de dirigir jogos nas competições nacionais e muito poucos chegam ao futebol profissional. Ser árbitro é um ato de coragem, independentemente do escalão ou nível da competição. Ser árbitro no panorama atual do futebol profissional em Portugal… é de loucos!

No sábado joga-se a final da Taça de Portugal. Arbitrar este jogo é um dos sonhos de qualquer árbitro. Esse sonho vai ser concretizado por mais um corajoso da arbitragem portuguesa. O árbitro em causa já há alguns dias, ou semanas, que saberá ser o eleito. Desde então que prepara este jogo. Ele sabe que nesta importante partida vai cometer erros. Tem-se preparado ao longo de toda a sua carreira para cometer o menor número de erros possível. Tem a esperança de que qualquer falha que tenha seja menor e sem qualquer relevância. Este homem sabe que, dado o contexto das equipas envolvidas e do ambiente que se vive em torno dos (in)sucessos destas, dificilmente sairá do Jamor sem que um dos lados lhe aponte erros. É a vida de um árbitro em Portugal.

O árbitro que vai dirigir a final da Taça, seja ele quem for, é um árbitro corajoso. É um homem corajoso. Não são decisões, mais ou menos felizes, que tenha tomado na época, que fazem com que não o seja. E não serão as decisões que venha a tomar nesse jogo que vão beliscar a sua coragem.

Conseguir manter-se dedicado, motivado e apaixonado pela arbitragem passados 20 ou mais anos de ter tido a ousadia de fazer o curso de árbitro é a maior prova de coragem. Que ninguém duvide disso!

Artigo de opinião publicado no jornal Record de 22 de maio de 2019