Adriana Correia dirige a publicação a todos os agentes desportivos, aos agentes envolvidos indiretamente no fenómeno futebol e obviamente a quem puder interessar.
O artigo põe em perspetiva o que é que um árbitro sente quando tem numerosas decisões para tomar e ainda é obrigado a lidar com a pressão externa de quem coloca em causa a integridade da pessoa "por detrás" do árbitro.
Escreve assim Adriana Correia:
"Antes demais é obrigatório fazer esta distinção: vou apenas falar sobre arbitragem de futebol distrital.
Ser árbitro!
Quem o é sabe bem o que é e como é!
Quem não é e nunca foi, aqui vai uma tentativa de resumo para perceberem o que é ser árbitro.
Caros jogadores, elementos técnicos, dirigentes e caros apoiantes dos clubes: peço aos que têm filhos que vejam um jogo a pensar que o árbitro poderia ser vosso filho. Aos que não têm... pensem que o árbitro poderia ser vosso pai/mãe... ou vocês próprios.
Primeiro é necessário distinguir o árbitro da pessoa. Eu fui árbitra de futebol mas sou a Adriana Correia. É verdade que errei enquanto árbitra mas também erro enquanto 'a pessoa' Adriana Correia.
Não devem por em causa a honestidade, valores e princípios da minha pessoa.
Já pensaram quantas decisões um árbitro toma por jogo? Assinalo/não assinalo, lançamento para a equipa A ou B, cartão amarelo ou cartão vermelho?! Tudo isto num segundo, em corrida/movimento e num piscar de olhos? No universo de decisões que tomamos apenas em 90 minutos (ou menos, dependendo do escalão), é natural errarmos! E o erro não pressupõe intenção. Logo, devem pensar bem antes de dizer que os árbitros roubam, porque roubar pressupõe intenção. Os árbitros são seres humanos, erram como todos. E erram muito pouco perante o enorme número de decisões que tomam durante apenas um jogo.
Depois é preciso pensar que estamos a falar do futebol distrital. Não me falem em "roubar" ou em "estarem comprados".... por favor!!, maior parte dos clubes têm de se gerir com um orçamento muito justo e apertado para fazerem face às suas despesas, portanto isso nem sequer faz sentido.
Tenho visto diversos jogos de distrital e importa também realçar que o público reclama e chama nomes ao árbitro só e apenas porque sim. Não sei se é libertação de stress ou de frustrações, mas peço a esses apoiantes que se ponham no lugar do árbitro pelo menos por 10 minutos. Façam esse exercício. Imaginem-se lá dentro, ponham clubismos de parte.
Muitas pessoas ainda pensam que o árbitro vai para o campo com o saco dos equipamentos, 'apita' e sai. E pronto, é isto. Não!, não é!
Um árbitro empenhado treina 2, 3, 4 vezes por semana. Antes ou depois de um dia de trabalho, lá vão eles treinar. E não vão só dar "umas corridas"... fazem treino específico, correm muitos km's, treinam a componente técnica no relvado. Quando saem (à noite) já são mais do que horas de jantar. Normalmente uma vez por semana vão a um núcleo de árbitros, onde discutem casos de jogo, tiram dúvidas (sim!, também têm dúvidas), aprendem mais e mais. Nestes dias a hora de chegada a casa é por volta de meia noite. E agora pensem... e a família?
Têm de estudar constantemente... têm de estar atualizados e têm de cumprir provas físicas e escritas algumas vezes por época.
No fim de semana normalmente sai-se de casa as 7h/8h da manhã de sábado e domingo e chega-se tarde. E vocês pensam: "ah mas o meu filh@/marido também, porque também têm jogo". Os vossos filhos/maridos têm apenas um jogo no fim de semana. Os árbitros têm 3/4/5 ou mais jogos (dependendo se fazem futebol 7).
Saem de manhã cedo, com sol, chuva, vento ou frio e vão arbitrar.
Estão o fim de semana todo longe da família.
Muitos são infelizmente ameaçados e agredidos. A sua integridade física e emocional é posta em causa.
Arbitram, tenham tido uma semana má de trabalho ou problemas emocionais em casa. E não levam os problemas para dentro do campo.
Correm muito.
Ganham pouco e apenas para os gastos. E recebem muitas vezes 2/3 meses depois.
Há o desgaste físico e emocional da quantidade de jogos que fazem...
... e por cima disto tudo.... ainda ouvem constantemente insultos de pessoas que não fazem sequer o pequeno esforço de pensar que aquela pessoa, que está ali por gostar efetivamente do que faz (sim, porque é mesmo preciso gostar!), podia ser seu filho/marido/namorado/familiar... ou você próprio!
Pensem só um bocadinho nisto."
Fonte: Blog - Dri Just get a better world