Parece haver vontade real para que o público possa regressar aos estádios já a partir do próximo mês, quando começar a época desportiva de 2020/21.
A expetativa é legítima e percebe-se porquê: a reta final do último campeonato foi insonsa e pouco entusiasmante. Faltou-lhe alma e essência. Faltou-lhe a sua força maior: a presença maciça de adeptos nas bancadas. Isso parece-me inegável.
Futebol sem gente é como verão sem sol: aguenta-se… mas não tem piada nenhuma.
E, de facto, não teve.
Por muito que tenha existido um esforço assinalável para que tudo corresse bem – parar em definitivo teria sido o caos para muitas instituições e profissionais -, a verdade é que sem gritos e assobios, sem cânticos e cachecóis, sem aplausos e incentivos, sem tarjas e bandeiras, a coisa foi completamente diferente.
Diferente para pior.
Não sou apenas eu que o digo. É quem esteve lá dentro. É quem sentiu, na pele, o ruído ensurdecedor do silêncio.
Não faz sentido nenhum atuar num teatro sem plateia.
Claro que a tarefa – a de voltar a levar pessoas aos estádios – não é fácil e exige grande responsabilidade. O desafio não pode nunca colocar em causa o esforço que tanta gente fez para preservar a saúde pública, esse bem maior.
Mas há formas de encontrar soluções que permitam um regresso progressivo, controlado e seguro.
A prova maior já foi dada noutras áreas e a partir daí abriu-se a Caixa de Pandora.
É normal que o futebol exija agora idêntica equidade e coerência. E é normal que refute, de imediato, todo e qualquer argumento falacioso que diga que quem assiste, ao vivo, a touradas, espetáculos de comédia ou manifestações políticas (e não só), é diferente do adepto de futebol.
Com todo o respeito… menos. Não insultem a inteligência dos outros.
É que, por agora, ninguém pede estádios cheios, adeptos a celebrar aos abraços e beijinhos ou gente separada por apenas uma ou duas cadeiras de distância. O que se pretende é bem mais razoável: para começar, uma lotação reduzida a cerca de ⅓ da capacidade máxima de cada estádio. Porque não?
Obviamente que agilizar isso dá muito trabalho: é necessário saber quantas pessoas podem adquirir ingressos com antecedência; é fundamental que exista controlo apertado nas entradas; é crucial que essas estejam bem sinalizadas; é importante filtrar os transportes/acessos ao estádio; é imperioso impedir aglomerados de pessoas em espaços exíguos; não se recomendam espaços comerciais de venda nas imediações; o espaçamento entre adeptos deve ser grande; o uso de máscaras e a desinfeção das mãos deve obedecer a regras bem definidas; as bancadas e zonas comuns devem ser higienizadas a toda a hora, enfim, todo o processo exigirá planeamento, organização e execução cuidada, mas… vale ou não vale a pena o esforço?
Eu digo que sim e assino por baixo.
A pandemia impôs-nos uma vivência confinada e atípica, com todos os benefícios e prejuízos daí inerentes. Continuo a pensar que todas as opções tomadas, em matéria de saúde, foram sensatas e que esse foi um “mal” necessário.
Mas agora é tempo de seguir em frente, cumprindo simultaneamente com as instruções de quem sabe. É tempo de lutar e contrariar. É tempo de sobreviver ao vírus que pode agora matar de muitas mais formas do que mata de verdade.
É tempo de continuar a viver, sem medo.
Sempre sem medo.